terça-feira, 16 de outubro de 2018
Um convite ao pensar
Dentre as mais valiosas conquistas da Democracia estão a liberdade de pensamento, a possibilidade de questionar e o direito à livre-expressão. Toda e qualquer argumentação pode ser válida e celebrada, se respeitadas as diferenças, os arbítrios individuais e os compromissos éticos.
Somos jornalistas, membros de uma categoria amparada no social, na defesa dos direitos humanos fundamentais e no combate às opressões, conforme estabelece o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, cuja redação foi revisada e aprovada na cidade de Vitória (ES) em 2007, durante o Congresso Nacional dos Jornalistas.
É com preocupação que o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato Grosso do Sul, chapa Ocupa Sindjor, democraticamente eleita para conduzir a entidade sindical no triênio 2017-2019, recebe nota de repúdio em relação ao apoio dispensado à frente de jornalistas pela democracia espontaneamente formada por profissionais da categoria incomodados com a atual situação política do país.
Preocupação, porque há claro desconhecimento do papel de um sindicato em relação à defesa da Democracia.
Preocupação, porque há distorção em relação ao mito da imparcialidade jornalística, alimentado historicamente pelo senso comum e intensamente confundido com qualidade de apuração.
Preocupação, porque a nota surgiu de um coletivo de profissionais, majoritariamente não filiado e ausente da entidade, que não compreende com clareza dos ditames do Código de Ética que norteia nossa atividade laboral.
À frente da entidade há 2 anos e meio, o Coletivo Ocupa Sindjor foi eleito para representar a categoria, em eleições ocorridas em meados de 2016. Um grupo de coalizão foi formado após o entendimento de que era preciso reunir esforços - e não, dividi-los - para executar efetivamente o papel da entidade no tocante à defesa dos direitos trabalhistas e na valorização da profissão.
O Sindjor-MS, independentemente de sua gestão, tem, portanto, compromisso com o papel social da nossa atividade laboral - esta que é baseada em um Código de Ética supramencionado.
Traz seu artigo 3º, a propósito, que "o exercício da profissão de jornalista é uma atividade de natureza social e de finalidade pública".
Traz, também, em seu artigo 6º, item I, que é dever do jornalista "opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos".
Isto posto, o Sindjor-MS destaca que é eticamente impossível manter-se isento - e nem haveria por quê - diante dos atuais fatos políticos, nos quais avaliamos, junto à Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), existência de graves riscos à Democracia.
Esta conclusão ocorre diante das declarações ameaçadoras, violentas, caluniosas e difamatórias que partem do candidato à presidência Jair Bolsonaro, do partido PSL, que protagoniza o primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto do atual pleito. Colegas que atuam no nosso mercado já foram alvos de campanha de linchamento virtual no exercício legítimo de seu trabalho. Não podemos fazer vistas grossas.
Assim como nossa Federação, percebemos a gravidade do cenário político diante da forte possibilidade de o candidato alcançar a presidência. É a percepção da ameaça das prerrogativas jornalísticas, diante dos fatos já citados, e tantos outros nos quais profissionais foram desrespeitados por ele durante o exercício da profissão.
E, por seu compromisso com a profissão, previsto nos demais itens do artigo 6º de nosso Código de Ética, só resta à entidade a obrigação de integrar esta frente de resistência, caso o candidato seja eleito ao cargo presidencial.
Assim, o Sindjor-MS reforça que não recuará e seguirá - dentre as várias outras atividades que são de conhecimento da categoria - com o apoio aos colegas que espontaneamente compuseram um grupo de enfrentamento e com o acolhimento das ideias do coletivo que orgulhosamente emergiu para defender a Democracia neste momento tão sensível.
Mesmo que isso desagrade parcela dos profissionais que, de direito, são representados pela entidade, apesar de, em sua maioria, nunca terem se apresentado ao debate, até essa oportunidade.
Mesmo que estes profissionais, lamentavelmente, compreendam de forma distorcida o papel social do jornalismo e das entidades sindicais.
Destacamos, ainda, que apesar da preocupação, é sem surpresa que a nota de repúdio foi recebida. Trata-se de uma questão sintomática dos rumos do Jornalismo nos últimos anos. Sobretudo, nos meses recentes - quando constatamos com pesar o imenso número de jornalistas sul-mato-grossenses que compartilharam, sem atender o critério básico de checagem, notícias falsas que, atualmente, já são entendidas como uma das engrenagens que ataca nossa tão jovem e frágil Democracia.
Enxergamos, portanto, a necessidade de pensar e refletir a profissão. De fazer a autocrítica, mesmo que solitária. E logo, perguntamo-nos quais caminhos queremos seguir, e o que fazer para evitar que manifestações tão distópicas da real função do Jornalismo ocorram, como na nota recebida nesta manhã.
Perguntamo-nos onde está a falha, a lacuna a preencher para que sejamos sujeitos de transformação, autores de pensamentos razoáveis, não-rasos.
Está no processo de formação do jornalista, nas universidades? No enfraquecimento da profissão a partir da não-obrigatoriedade de diploma ou de comprovação de experiência para obtenção de registro profissional? No mercado de trabalho que submete a categoria a situações ultrajantes? Na falta de reflexão diante de uma sociedade que tem seus direitos fundamentais frequentemente aviltados?
Não temos, ainda, uma resposta. Mas, temos posicionamento e compromisso com a Democracia. Doa a quem doer.
Diferente do que afirma a nota de repúdio, não é possível mensurar, ao menos ainda, qual o posicionamento da mídia sul-mato-grossense. Não é razoável, a propósito - para não dizer absurdo - que "opinião" seja um critério de dicotomia da classe, quando o que norteia a profissão está em redação clara, conforme explanado nas linhas acima.
Reforçamos: o compromisso com o Código de Ética não é negociável. O jornalismo, independente de quem o compuser, não é a ditadura de uma suposta maioria.
Por outro lado, o que se sabe, de certo, é que na noite da segunda-feira (15), a sede do Sindjor-MS em Campo Grande foi orgulhosamente aberta para acolher dezenas de profissionais compromissados com a Democracia, com o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros e com a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
O que é se sabe é que o grupo de profissionais que fazem essa frente é crescente, busca unidade e segue de braços abertos para acolher colegas que aceitem integrar a resistência ou que queiram, ainda, refletir sobre a importância de tal ato.
O que se sabe é não estamos sozinhos neste momento. E que seguiremos, nos próximos anos, nesta frente de jornalistas compromissados com a sociedade, com o fortalecimento da categoria e com o resgate da credibilidade do jornalismo.
O encontro realizado no sindicato não foi de apoio a candidatura alguma, tratou de assuntos considerados essenciais nesse momento - entre eles o combate à proliferação das fake news e o apoio mútuo entre os jornalistas para assegurar o direito de exercer a profissão.
Em tempos de candidatos mobilizando exércitos virtuais para atacar profissionais, não é possível ficar de braços cruzados. Os jornalistas já mobilizados entendem que é urgente se mobilizar em uma frente de resistência.
Esta não é uma nota em resposta ao repúdio que a nós foi dispensado. É um convite ao pensar, à autocrítica, à defesa da profissão, das prerrogativas jornalísticas e ao bem-comum.
O Sindjor-MS está e sempre estará de portas abertas a todas e todos que compõem nossa valorosa profissão, e que aceitem o desafio diário de lutar pelas liberdades, pelo fortalecimento da classe, pela evolução da sociedade e pelo combate do autoritarismo, preconceitos e demais opressões.
Sejam todas e todos bem-vindos. Sempre. Pela defesa da Democracia.
Campo Grande (MS), 16 de outubro de 2018
Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato Grosso do Sul
Gestão Ocupa Sindjor
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